Pesquisa Revela que Anabolizantes Causam Danos ao Coração e ao Cérebro

Reportagem da revista ISTOÉ de 11 de dezembro de 2009 trata de pesquisa
em torno dos danos que podem ser causados pelo uso de anabolizantes
esteroides. Acompanhe:
Medicina & Bem-estar
| N° Edição: 2092 | 11.Dez - 21:00
O dano dos Anabolizantes
Pesquisa inédita revela que essas substâncias degeneram a saúde do coração, do cérebro e elevam o risco de morte súbita
Mônica Tarantino
Pela primeira vez, a medicina conseguiu descrever o impacto
provocado pelo uso de esteroides anabolizantes no coração e no cérebro.
Em um estudo que teve duração de quatro anos, a cardiologista Janieire
Alves, da Unidade de Reabilitação Cardíaca e Fisiologia do Exercício do
Instituto do Coração, de São Paulo, avaliou 40 homens com idades entre
18 e 40 anos que assumidamente se automedicavam com doses regulares
dessas substâncias havia dois anos. Essas drogas imitam o hormônio
masculino testosterona e são usadas com a finalidade de aumentar a massa
muscular e reduzir a fadiga.
Os prejuízos ao corpo são
impressionantes. “Os usuários apresentam um risco cinco vezes maior de
ter acidente vascular cerebral, parada cardíaca ou morte súbita do que a
população em geral”, afirma a médica Janieire. As conclusões do
trabalho serão publicadas em maio de 2010 pela mais renomada revista
científica de medicina do esporte, a “Medicine & Science in Sports
& Exercise”, do American College of Sports Medicine. “É um avanço
mundial no conhecimento sobre a utilização desses compostos”, afirma
Carlos Eduardo Negrão, que participou da pesquisa.
Os voluntários
do estudo foram submetidos a testes de sangue e a exames para medir a
capacidade pulmonar e cardíaca de oxigenar o corpo a cada quatro meses.
Porém, essa exigência reduziu o número final de participantes. Só 12
fizeram todos os testes. Além disso, dois tiveram morte súbita e um
ficou com câncer de fígado. Os exames revelaram uma preocupante redução
do colesterol bom (HDL) e o aumento do ruim (LDL) e dos níveis de
pressão arterial (leia mais no quadro), o que eleva o risco de
entupimento dos vasos sanguíneos cerebrais e do coração.
A
cardiologista Janieire também identificou uma intensa mudança no ritmo
do sistema nervoso simpático, que regula a contração dos vasos, a
aceleração dos batimentos cardíacos e a concentração do hormônio
noradrenalina no sangue. Essas modificações aumentam o esforço do
coração para bombear o sangue. “Há casos em que os músculos e áreas do próprio coração recebiam apenas 40% do sangue necessário”, diz a cardiologista.
A
associação dessas alterações aumenta as chances de insuficiência
cardíaca precoce. O que os pesquisadores não conseguiram saber é se
esses efeitos são reversíveis, com a interrupção do uso. “Não foi
possível ter essa resposta porque os voluntários voltavam a tomar as
substâncias quando sentiam uma perda de massa muscular”, lamenta
Janieire.
A “bomba” é ainda pior
Nova pesquisa alerta para os perigos dos anabolizantes. E revela que eles podem levar à morte súbita de seus usuários
Por Monica Tarantino
O
efeito dos anabolizantes sobre o coração e o cérebro é muito mais
perigoso do que se suspeitava. Pesquisa recente, coordenada pela
cardiologista Janieire Nunes Alves, da Unidade de Reabilitação e
Fisiologia do Exercício do Instituto do Coração, em São Paulo, revelou
que os usuários dessas substâncias têm cinco vezes mais riscos de sofrer
um derrame ou parada cardíaca. E que o uso de anabolizantes pode causar
câncer e até levar à morte súbita. Confira, abaixo, a entrevista
exclusiva que a especialista concedeu a ISTOÉ Online.
ISTOÉ – Quem participou da sua pesquisa?
Janieire
Alves – Homens com idade entre 18 e 40 anos que tomavam essas
substâncias havia dois anos. Para achá-los, eu fui a várias academias,
especialmente a algumas em que se sabia serem pontos de consumo regular
de anabolizantes, para perguntar quem gostaria de participar da
pesquisa. Mas foi muito difícil conseguir voluntários. As pessoas têm
muito medo de ser expostas. Eles só aceitaram participar com a garantia
de sigilo absoluto de seus nomes. Um dos motivos é a sua participação em
competições, pois o uso de anabolizantes é ilegal. Consegui 40 pessoas,
mas apenas 12 fizeram todos os testes necessários.
ISTOÉ – Os testes de rotina, feitos por atletas, não detectam os anabolizantes?
Janieire
Alves – Detectam, mas há vários meios de mascarar esses resultados
durante o período de competições. Para fazer nosso estudo, por exemplo, a
sensibilidade do teste de urina feito inicialmente para atestar o uso
foi aumentada dez vezes. Esses exames foram realizados em parceria com a
professora Regina Moreau, no Laboratório de Toxicologia da Faculdade de
Farmacologia da USP.
ISTOÉ – Como essas substâncias são ingeridas?
Janieire
Alves – Por injeção ou via oral. No grupo estudado, vi que o uso se dá
em ciclos. As pessoas tomam por cerca de dois meses, depois param algum
tempo e voltam quando sentem que a musculatura começa a diminuir.
ISTOÉ
– Algum dos voluntários deixou de tomar anabolizantes depois de
conhecer mais sobre os efeitos que essas drogas estavam provocando no
organismo?
Janieire Alves – Não. De todas as pessoas que
participaram, apenas três aceitaram receber apoio psicológico para não
usar mais. Um deles estava com sintomas iniciais de câncer de fígado,
que é outro efeito colateral do uso constante dessas drogas.
ISTOÉ – Os anabolizantes causam alguma dependência física ou psicológica?
Janieire
Alves – Pude observar que a maioria dos voluntários manifesta um
transtorno de imagem conhecido como vigorexia. Por mais musculosos que
estejam, eles se vêem pequenos e, por isso, precisam ganhar mais massa
muscular. É praticamente o oposto da anorexia, em que a pessoa se julga
gorda, ainda que isso não corresponda ao peso apontado pela balança ou à
imagem refletida no espelho.
ISTOÉ – Qual é a substância mais consumida?
Janieire
Alves – No grupo analisado, o estanozolol. É uma droga injetável,
indicada para uso veterinário. Ela é mais consumida por ser mais
acessível e de baixo custo. Promove a recuperação da musculatura dos
animais. Mas existem dezenas de outras substâncias.
ISTOÉ – A musculatura obtida com anabolizantes é igual a conquistada com muita malhação?
Janieire
Alves – Nosso estudo mostrou que o ganho excessivo de musculatura, o
aumento do tamanho do músculo cardíaco e alterações de pressão acontecem
também com as pessoas que praticam musculação em alta intensidade, ou
participam das competições de halterofilismo, porém em magnitude muito
inferior àqueles que tomam anabolizantes. Na população estudada por nós,
identificamos que há uma piora significativa da irrigação dos tecidos.
Em testes para avaliar a capacidade cardíaca e respiratória, vimos que
essas pessoas ganham força, mas não têm condicionamento ou resistência
equivalentes.
ISTOÉ – Existe uma dose segura de anabolizantes?
Janieire
Alves - Os anabolizantes são substâncias análogas à testosterona,
fabricada nos testículos. Se ela já existe em quantidade suficiente no
organismo, doses adicionais inibirão a produção orgânica (natural). A
questão é que as substâncias sintéticas não são aceitas da mesma forma
que a testosterona natural por outras glândulas, o que inicia um
desequilíbrio na troca de mensagens entre os hormônios que regulam os
ritmos do corpo. Em consequência, isso leva aos efeitos indesejáveis. Na
minha opinião, não se deve tomar se não existe carência provada em
exames laboratoriais. O estudo que fizemos fornece sólido embasamento
científico mostrando que, para o sistema cardiovascular, essas
substâncias são muito deletérias. Elas agem, por exemplo, sobre a
glândula supra-renal, estimulando a maior liberação de noradrenalina,
que pode aumentar o risco de desenvolvimento de arritmias cardíacas
(alterações do ritmo cardíaco), podendo levar até à morte súbita.
FONTE: Revista ISTOÉ, edição 2092
Por Redação FISIculturismo
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